segunda-feira, 23 de setembro de 2013

dinossauros novo

Novo dinossauro jurássico da China

A descoberta desse réptil pré-histórico mostra que a diversidade dos dinossauros aparentados com as aves era maior do que se imaginava. Alexander Kellner explica em sua coluna.
Por: Alexander Kellner
Publicado em 29/01/2010 | Atualizado em 29/01/2010
Novo dinossauro jurássico da China
Detalhe do ‘Haplocheirus sollers’, dinossauro encontrado na China em camadas rochosas com cerca de 160 milhões de anos de idade (arte: Portia Sloan).
Algo me diz que este será o ano dos dinossauros! Mal 2010 começou e já tivemos vários estudos interessantes sobre esses répteis pré-históricos publicados, comdestaque, em revistas de primeira linha comNatureScience PNAS. As descobertas variam desde a cor dos dinossauros com penas até a maneira com a qual alguns voavam (veja mais nas Paleocurtas, ao fim deste texto).
Destaco nesta coluna a descoberta do Haplocheirus sollers, que acaba de ser divulgada pela Science em artigo assinado por uma equipe de pesquisadores americanos e chineses. A importância da pesquisa, coordenada pelo aluno de doutorado Jonah Choiniere (da Universidade de Washington, nos Estados Unidos), se deve a dois fatos principais – a raridade e a idade desse dinossauro.
A importância da descoberta se deve à raridade e à idade do novo dinossauro
Haplocheirus foi encontrado em depósitos da chamada formação Shishugou, na região de Wucaiwan, que pertence a província de Xinjiang (a mesma que inundou a mídia em 2009 devido a graves problemas entre etnias chinesas que impediram, inclusive, a realização de trabalhos paleontológicos).
Dados de datação absoluta (baseada em isótopos) revelaram que a camada da qual foi retirado esse dinossauro se formou entre 158 e 161 milhões de anos atrás, na parte superior do Jurássico. A partir de um esqueleto praticamente completo do Haplocheirus, Choiniere e colegas puderam observar características compartilhadas entre essa espécie e outros dinossauros de um grupo conhecido como alvarezssauros, incluindo particularidades no crânio, úmero e fêmur. 
Haplocheirus sollers
Representação artística do ‘Haplocheirus sollers’. A descoberta dessa espécie confirmou que o grupo dos alvarezssauros surgiu no Jurássico Superior (arte: Portia Sloan).

Os enigmáticos alvarezssauros

A primeira descrição de um dinossauro desse grupo foi feita em nosso continente. Ao receber ossos isolados enviados por um antigo reitor da Universidade de Comahue, na província de Neuquén (Argentina), o paleontólogo José Bonaparte descreveu oAlvarezsaurus calvoi, que viveu naquela região há cerca de 85 milhões de anos. O pesquisador argentino já imaginava que essa espécie representava um grupo distinto dos demais dinossauros carnívoros conhecidos até então.
Mononykuscausou furor ao ser classificado como uma ave primitiva que não voava
Posteriormente foi encontrado na Mongólia um outro dinossauro – o Mononykus – em rochas com cerca de 70 milhões de anos. Essa espécie causou um verdadeiro furor entre os paleontólogos ao ser classificadacomo uma ave primitiva que não voava, causando intensos e apaixonados debates em congressos e reuniões científicas.
À medida que as pesquisas prosseguiam, os cientistas puderam estabelecer um elo entre as duas espécies, que passaram a ser consideradas como parte de um mesmo grupo – os alvarezssauros. Depois disso, mais espécies desse grupo foram encontradas em outras regiões, incluindo Europa e América do Norte, o que mostra que os alvarezssauros, apesar de raros, tinham uma distribuição ampla durante o Cretáceo.
Alvarezssauro
Representação artística de uma espécie do grupo dos alvarezssauros, caracterizados pelos membros anteriores bem curtos, entre outros aspectos (arte: Wikimedia Commons).
Os dinossauros desse grupo tinham como principal característica os membros anteriores bem curtos, similares aos doTyrannosaurus rex. Os dedos das patas eram ainda mais reduzidos – com exceção do segundo dígito, que tinha uma grande garra. Até hoje não se tem uma ideia exata de para que servia esse dígito. Algumas hipóteses sugerem que eles serviam como forma de defesa; outras defendem que os alvarezssauros eram cavadores e que elas serviam com esse intuito.
Especulações à parte, houve grande discussão sobre se o Mononykus e os demais alvarezssauros poderiam ou não ser classificados como aves ou mesmo dentro do grupo Maniraptora, no qual são agrupados os dinossauros proximamente relacionados às aves. Alguns paleontólogos alegavam que, como esses dinossauros enigmáticos haviam sido encontrados apenas em depósitos do Cretáceo, não tinham qualquer relação direta ou mesmo indireta comas aves, cujas primeiras formas são jurássicas.

Hipótese confirmada

A descoberta do Haplocheirus sollers veio trazer novos elementos para se entender essa questão. Alguns paleontólogos haviam proposto que os alvarezssauros deveriam ter-se originado no Jurássico Superior. A espécie chinesa recém-descrita acaba de confirmar esta hipótese.
Além disso, o Haplocheirus sollers mostra que os dinossauros aparentados com as aves que formam o grupo Maniraptora eram mais diversificados no Jurássico do que se acreditava até aqui. Sempre é bom relembrar que a primeira ave – o Archaeopteryx também provém de rochas jurássicas.
Patas de alvarezssauros
A pata do 'Haplocheirus sollers', representada no alto, tinha os dedos mais alongados do que os de outros alvarezssauros, como o 'Shuvuuia deserti', cuja pata está representada logo abaixo (esquema: Science).
O estudo de Choiniere e colegas também se destaca por um outro ponto: ele permite entender um pouco melhor como os curiosos braços dos alvarezssauros evoluíram ao longo do tempo. Ao contrário das formas mais derivadas do grupo, como o Shuvuuia, o Haplocheirus tinha os dedos mais alongados, particularmente o terceiro e o quarto. Mas já se pode perceber que o segundo dígito estava era mais possante que os demais.
A descoberta do Haplocheirus é mais uma peça no quebra-cabeça da história evolutiva dos curiosos alvarezssauros. Ainda falta bastante, no entanto, para que ela possa ser contada por inteiro. É bom enfatizar que, entre a nova espécie da China e as formas do Cretáceo, existe uma diferença de aproximadamente 75 milhões de anos. É muita coisa! Novas descobertas – sobretudo de espécies da base do Cretáceo com 120 a 100 milhões de anos – são necessárias para complementar esse quadro. Quem sabe não damos sorte aqui mesmo no Brasil...

Alexander Kellner
Museu Nacional / UFRJ
Academia Brasileira de Ciências

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